domingo, 17 de junho de 2007

As dimensões do espaço

Como saber se a nossa percepção da realidade não é enganosa?

Quantas dimensões espaciais existem? "Fácil", diria o leitor, "são três: comprimento, largura e altura. Ou, se você preferir, norte-sul, leste-oeste e a vertical". Sem dúvida, são essas as dimensões que percebemos no nosso dia-a-dia, as dimensões em que nos locomovemos. Mas será que é só isso? E se existirem dimensões que são invisíveis aos nossos olhos, ou mesmo microscópicas, por serem muito pequenas? Como se certificar de que nossa percepção da realidade não é enganosa?
Dou um exemplo. Imagine uma mangueira num jardim. De perto, a mangueira é um cilindro bem longo, tendo duas dimensões: seu comprimento e sua circunferência. Uma formiga pode tanto andar ao longo da mangueira quanto dar voltas ao seu redor. Mas, de longe, a mangueira vai se parecendo cada vez mais com uma linha e menos com um tubo.

Perdemos a percepção de que ela tem também uma largura. Bem de longe, a mangueira é indistinguível de um objeto com uma dimensão apenas, seu comprimento. Nem sempre nossa percepção da dimensionalidade do espaço corresponde à realidade. Tudo depende de perspectiva e da precisão dos nossos instrumentos de medida.

Como dizia o filósofo francês do final do século 17 Bernard Le Bovier de Fontenelle, queremos sempre saber mais do que enxergamos. A filosofia (leia-se busca pelo conhecimento) é conseqüência da combinação da nossa curiosidade com nossa miopia. Voltando às dimensões do espaço, talvez sejamos apenas míopes. Em matemática, pensar sobre dimensões extras é relativamente simples. Basta adicioná-las às equações descrevendo às propriedades do espaço. Essa é uma das maravilhas da matemática, nos fornecer meios de especular sobre realidades imaginárias, cuja estrutura depende apenas de consistência lógica, sem qualquer compromisso com a realidade. Mas em física a coisa é diferente.

As ciências físicas têm como missão descrever a realidade natural, além das aparências ou das especulações. Podemos especular sobre quantas dimensões espaciais existem, mas a realidade é uma só. A física busca por uma descrição da realidade cada vez mais completa.

A idéia de que existem dimensões extras surgiu em 1919. O físico-matemático alemão Theodor Kaluza sugeriu que duas forças fundamentais da natureza, a gravidade e o eletromagnetismo, são, na verdade, uma só quando vistas em um espaço de quatro dimensões espaciais. Ou seja, ilhados na nossa percepção da realidade, limitada à três dimensões, deixamos de vislumbrar a unidade fundamental que existe na natureza. Essa idéia tem um apelo que vai além do científico.

Hoje, físicos continuam a formular teorias de unificação das forças em espaços com mais de três dimensões. Desde a época de Kaluza, foram descobertas mais duas forças fundamentais, as forças nucleares forte e fraca, que atuam no interior do núcleo atômico. Para acolher essas duas novas forças, segundo as teorias atuais, são necessárias nove dimensões espaciais, seis a mais do que as que percebemos. Onde estão elas?

Se existem, são muito pequenas para serem percebidas, mesmo com nossos microscópios mais poderosos. Existe a possibilidade, remota, de que seus efeitos sejam medidos em uma máquina gigantesca prestes a entrar em funcionamento na Suíça, um acelerador de partículas conhecido como LHC, que já mencionamos em outras colunas. Caso não sejam, provavelmente serão décadas até que possamos testar essa idéia. No meio tempo, é bom lembrar de que o que vemos é apenas a pequena parte da realidade.

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